quinta-feira, 3 de maio de 2007

Prosa com um amigo do Cerrado

Visitando o blog do candango Carlinhos Veiga (http://carlinhosveiga.blogspot.com) , li um texto muito legal sobre os cantos da cigarra e do sabiá. Pude refletir sobre a capacidade criativa de Deus, sua provisão e companheirismo. Gostei tanto que aproveitei para escrever um texto com os mesmos personagens.

Esse mundo tá louco mesmo Carlinhos. Depois que o cristo, o redentor carioca, entrou em campanha para ser uma das maravilhas do mundo contemporâneo, eu percebi que a maior maravilha atualmente é ter a capacidade de descobrir coisas grandes através de pequenos momentos.
Um dia desses, passando embaixo da ponte Rio-Niterói percebi que havia uma orquestra de cigarras e fiquei impressionado com aquilo. Era um contraste muito interessante: o ruído dos carros engarrafados e o canto das cigarras. Cena que nenhuma vanguarda poderia idealizar: uma gigantesca ponte servindo de palco e um grande público obrigatoriamente presente. Talvez a Ponte devesse concorrer no lugar do cristo, visto que aquela tem espetáculo e esse só fica de braço aberto.
No estresse cotidiano muita gente sequer percebeu o canto das cigarras. Então, nem precisa dizer que o canto da cigarra ser anunciação de chuva é algo que a massa urbana desconhece. E se conhecesse preferiria ignorar, pois chuva no Rio de Janeiro quase sempre significa alagamento, transbordamento, deslizamento, desabrigo, descaso, morte, choro. A vida numa metrópole marcada pela violência e todo tipo de corrupção do caráter humano, endurece os corações e burocratiza as mentes. A cultura urbana carioca potencializa o afastamento dos homens e mulheres não só de Deus como da sua criação também. Isso me faz entender porque chove tanta água, bala, sangue, lágrima. A sociedade urbana louva suas próprias criações de concreto, aço e carbono e elege seu cristo de pedra como a grande maravilha.
As teorias sociais me ajudam a entender o fênomeno urbano, mas não acalentam a angústia do meu coração e a inquietude da minha alma. Porque de nada adianta entender o processo se me torno insensível à cigarra que canta, à família que mora e aos trabalhadores que passam, todos na mesma ponte. Se não reconheço o valor da chuva que enche ainda mais a Guanabara, não reconheço a criação nem seu criador. Como produto da cidade, conectado a seu terrritório, vivo essas aflições. Mas o meu desejo está longe daqui. Longe do cristo que vejo da janela do escritório. Meu acalento está na orquestra de cigarras - seja em Niterói ou Brasília. Está também com a família de sabiás e bem-te-vis que cantam na janela do meu quarto e alegram a mim e minha esposa pelas manhãs. Meu acalento está em Deus. Está no Redentor, o Cristo. Por isso consigo entender que as cigarras no cerrado ou no litoral, assim como os céus, "proclamam a glória de Deus e anunciam a obra de suas mãos". Por isso sei que e Deus não nos abandonou, nem quando resolvemos andar sobre as águas sem Ele.

2 comentários:

Carlinhos Veiga disse...

Deivid, que legal... Cara, fiquei espantado quando vi que você havia escrito um texto resposta. Bom demais... Gostei! Interessante como um mesmo elemento pode representar duas coisas diferentes em dois cenários diferentes. Uma cigarra, duas cidades, duas realidades. Uma chuva, dois contextos, duas expectativas.
Preciso dizer que gostei muito do seu texto, da maneira gostosa como você escreve, como "expõe" sua alma aos leitores. Escreva mais... sempre mais...
Abraços saudosos.

Unknown disse...

Cara os dois textos são maravilhosos, tanto o seu, quanto o do Carlinhos, quando li "a maior maravilha atualmente é ter a capacidade de descobrir coisas grandes através de pequenos momentos", panquei, pois em várias vezes em minha vida sinto uma presença poderosa de Deus em momentos aparentementes insignificantes, como beber um copo de água.Para nós, filhos, sacerdotes e proclamadores do evangelho de Cristo esse é um momento peculiar, de sensibilidade que só o Espírito Santo pode nos proporcionar, que continuamos assim...
Abraço.
(*)Mais um grande admirador do canto das cigarras.